Com a aprovação na reunião de Conselho de Ministros a 28 de Novembro de 2024, a alteração da Lei dos Solos será então introduzida, «promove uma alteração ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), permitindo o aumento da oferta de solos destinados à construção de habitação» (1)
Estabelecem-se assim as alterações significativas ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), popularmente conhecido como a Lei dos Solos. Estas mudanças visam dar resposta à crise habitacional em Portugal, criando condições para aumentar a oferta de habitação acessível, permitindo construir em locais onde hoje não é possível edificar, como sejam terrenos rústicos, solos em REN e RAN (com condicionantes), através da sua reclassificação para solo urbano, embora exclua «áreas mais sensíveis do ponto de vista de riscos, de conservação da natureza e de elevado potencial agrícola». (1)
Ao introduzir um regime especial para a reclassificação de terrenos como solo urbano, o governo procura aumentar a oferta habitacional, sobretudo em segmentos acessíveis à classe média. Mas o que exatamente muda com esta legislação? Quais os impactos esperados? E que desafios surgem com a sua implementação? Interfere com a construção de moradias?
ÍNDICE
ToggleRECLASSIFICAÇÃO DO SOLO: A CHAVE PARA O AUMENTO DA OFERTA HABITACIONAL
Uma das principais inovações desta legislação é a introdução de um regime especial que permite a reclassificação de terrenos rústicos para solo urbano. No entanto, esta possibilidade não é ilimitada: os terrenos devem cumprir critérios rigorosos e respeitar valores de interesse público, como proteção ambiental e segurança.
CRITÉRIOS PARA RECLASSIFICAÇÃO DO SOLO
Podem ser reclassificados terrenos compatíveis com áreas urbanas já existentes, desde que:
- Não estejam em áreas protegidas (como parques naturais ou zonas ambientalmente sensíveis);
- Não estejam localizados em zonas de risco, como áreas suscetíveis a cheias ou deslizamentos de terra;
- Não incluam terrenos agrícolas de alta qualidade, essenciais para a produção alimentar;
- Não pertençam à Reserva Ecológica Nacional (REN). (*)
(*) Critérios ainda totalmente por definir. O projeto de diploma segue agora para audições da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e outras entidades.
Estes critérios refletem o equilíbrio necessário entre o aumento da urbanização e a preservação ambiental. Mesmo em terrenos que cumpram as condições, a lei exige que sejam tomadas medidas para prevenir riscos e proteger os valores naturais fundamentais.
HABITAÇÃO ACESSÍVEL: A PRIORIDADE DA ALTERAÇÃO DA LEI DOS SOLOS
O novo regime não se limita a facilitar a reclassificação de terrenos: estabelece também regras claras para garantir que a maioria da área construída seja destinada à habitação acessível. Este é, sem dúvida, o ponto central da legislação, com implicações significativas no mercado imobiliário.
Percentagem Mínima Dedicada à Habitação
A lei exige que pelo menos 70% da área total de construção em terrenos reclassificados seja destinada a:
- Habitação pública;
- Arrendamento acessível;
- Habitação de valor moderado.
O objetivo é assegurar que grande parte das novas construções seja utilizada para resolver problemas habitacionais, evitando que os terrenos sejam usados para projetos de luxo ou especulação imobiliária.
O Conceito de “Habitação de Valor Moderado”
Esta nova categoria é um dos aspetos mais inovadores da legislação, destinada a apoiar a classe média. Segundo a lei, “habitação de valor moderado” refere-se a imóveis cujo preço por metro quadrado:
- Não ultrapasse a mediana nacional de preços de venda; ou
- Não exceda 125% da mediana do concelho (até ao limite de 225% da mediana nacional).
Atualmente, com base nos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o preço mediano em Portugal é de 1.661 euros/m², o que estabelece um teto máximo de 3.737 euros/m² (225% da mediana nacional). Em regiões como Lisboa e Cascais, onde os preços habitacionais frequentemente ultrapassam este limite, os promotores terão de ajustar significativamente os valores, o que representa um grande desafio para os setores público e privado.
IMPACTOS GEOGRÁFICOS E REGIONAIS DA NOVA LEI DOS SOLOS
O impacto desta legislação será especialmente sentido em áreas metropolitanas, como Lisboa e Porto, onde os preços habitacionais têm aumentado rapidamente. Por exemplo, em Lisboa, o preço médio por metro quadrado é de 4.203 euros/m², ultrapassando em 11% o limite máximo estabelecido pela lei para “habitação de valor moderado”. Em algumas freguesias, como Santo António e Marvila, as diferenças são ainda mais extremas, com preços que podem ultrapassar os 6.000 euros/m².
Desafios para Promotores e Municípios
Os promotores imobiliários terão de equilibrar os custos elevados de construção nestas zonas com os limites de preço impostos pela legislação. Por outro lado, os municípios terão de garantir que a reclassificação dos terrenos resulte em habitação acessível, sem comprometer a qualidade dos projetos ou a sustentabilidade urbana.
COMO FUNCIONA O PROCESSO DE RECLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS?
Um dos aspetos-chave do novo regime é que o processo de reclassificação é conduzido exclusivamente pelas Câmaras Municipais. Os proprietários de terrenos rústicos não podem iniciar o processo diretamente, mas podem participar de forma indireta, manifestando interesse e contribuindo em consultas públicas.
Etapas do Processo
- Proposta da Câmara Municipal
A autarquia apresenta uma proposta fundamentada, incluindo a delimitação da área a reclassificar, o número de fogos habitacionais previstos e a programação das obras de urbanização.
- Consulta Pública<
A proposta é submetida a consulta pública durante um prazo mínimo de 20 dias, permitindo que cidadãos e entidades interessadas apresentem sugestões.
- Aprovação pela Assembleia Municipal
Após análise e possíveis ajustes, a proposta final é votada pela Assembleia Municipal, que tem a decisão final sobre a reclassificação.
Registo Predial
A reclassificação fica automaticamente registada, simplificando os procedimentos para os proprietários.
PRAZOS E OBRIGAÇÕES: GARANTINDO A UTILIZAÇÃO DOS TERRENOS
Uma das preocupações desta lei é evitar a especulação imobiliária. Para isso, estabelece um prazo máximo de cinco anos para a execução das operações urbanísticas nos terrenos reclassificados. Caso os projetos não sejam realizados dentro deste prazo, a reclassificação pode caducar, e o terreno retorna à sua classificação original.
Além disso, os contratos de compra e venda de terrenos reclassificados incluem cláusulas que vinculam os novos proprietários às obrigações estabelecidas, garantindo a continuidade do projeto habitacional acessível. Assim, ao comprar terreno que tenha sido alvo de reclassificação dos solos, fica vinculado a estas condicionantes para edificar.
SIMPLIFICAÇÃO E AUTONOMIA MUNICIPAL PARA A RECLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS
A nova legislação também introduz medidas para simplificar os processos administrativos e aumentar a autonomia das autarquias locais. Estas mudanças incluem:
- Processos simplificados para alteração dos Planos Diretores Municipais;
Eliminação de aprovações externas, concentrando a decisão nas câmaras e assembleias municipais;
- Prazos reduzidos para consulta pública e aprovação.
Estes mecanismos pretendem agilizar a disponibilização de terrenos para habitação, sem comprometer a transparência ou a consulta pública.
BENEFÍCIOS E DESAFIOS
Benefícios Esperados
- Aumento da oferta de habitação acessível: Com 70% da área construída dedicada a habitação pública ou moderada, espera-se que mais famílias da classe média tenham acesso a casas a preços justos.
- Reequilíbrio do mercado imobiliário: Ao regular os preços e fomentar a construção em terrenos subutilizados, a lei pode reduzir a pressão sobre o mercado habitacional em áreas urbanas.
- Preservação ambiental: A exclusão de terrenos em áreas protegidas e agrícolas demonstra um compromisso com a sustentabilidade.
Principais Desafios
- Cumprimento dos limites de preço: Em zonas com custos de construção elevados, como Lisboa, será difícil oferecer habitação a preços dentro dos limites impostos.
- Gestão local: A eficácia da lei depende da capacidade técnica e administrativa das autarquias, que variam significativamente em Portugal.
- iscos de caducidade: Os prazos rígidos para execução podem ser desafiadores para promotores e municípios, especialmente em projetos de maior escala.
UM PASSO NA DIREÇÃO CERTA?
A nova Lei dos Solos representa um esforço ambicioso para enfrentar a crise habitacional em Portugal. Ao combinar mecanismos de simplificação administrativa com critérios rigorosos para reclassificação do solo, aumentar a realização de projetos de arquitetura e promover mais construção, a legislação busca criar um modelo urbano mais acessível.
No entanto, o sucesso desta política dependerá de vários fatores, incluindo a capacidade de municípios e promotores imobiliários em implementar as medidas, a adaptação do mercado às novas exigências e a fiscalização eficaz para evitar abusos ou desvios e garantir a construção a custos controlados, podendo haver uma nova era de casas modulares.
A nova Lei dos Solos poderá ser uma ferramenta crucial para garantir que o direito à habitação seja efetivamente concretizado, promovendo cidades mais inclusivas.
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